Empresários e deputados ruralistas querem tirar direitos conquistados pelos trabalhadores
Alegando que a Lei 12.619/2012, que regulamentou a profissão de motorista, é inflexível, e assim impossível de ser cumprida, os empresários receberam o apoio de deputados ruralistas na luta contra os direitos conquistados pelos trabalhadores
Desde a paralisação ocorrida no Dia do Motorista – 25 de julho contra a regulamentação, que está sendo investigada pelo Ministério Público do Trabalho pela atuação de empresários no apoio a greve - o que configura locaute e é ilegal, os empresários conseguiram repercutir um lado negativo inexistente na lei.
No primeiro momento a greve não teve seu foco com base na Lei dos Motoristas. Tinha como objetivo 8 pontos de reivindicação contra a Agência Nacional de Transporte Terrestres – ANTT, que tem como competência assegurar a adequada prestação de serviços de transporte terrestre, no setores de ferrovias e rodoviário e não a legislação sobre as normas do trabalho.
Com alegações falhas de que a Lei é inflexível e isso a torna impossível de ser cumprida, manifestantes liderados pelo empresário Nélio Botelho, presidente do Movimento União Brasil Caminhoneiro – que não possui representatividade dos trabalhadores, conseguiram o apoio de parlamentares que defendem os empresários do agronegócio para tentar retroceder os direitos conquistados com a sansão da Lei 12.619/2012.
Entenda a Lei 12.619/2012
Um das reivindicações dos manifestantes é contra o descanso interjornada de 11 horas, porém, no caso dos autônomos, esse intervalo pode ser fracionado em 9 horas mais 2 horas, no mesmo dia, ou seja, é flexível.
Para os empregados, existe a possibilidade de manter as mesmas condições de 9 horas mais 2 horas, por negociação coletiva entre as entidades sindicais e trabalhadores e empregadores – prevista no Art. 235H da CLT.
O descanso semanal poderá ser fracionado em 30 horas e mais 6 horas a serem cumpridas na mesma semana.
A jornada de trabalho de 8 horas diárias também pode ser prorrogada por até 2 horas, que serão consideradas extras. Para cumprir jornadas mais extensas poderá ser adotado o revezamento em dupla de motoristas.
Além disso, em situações de risco será permitido ao motorista a prorrogação da jornada de trabalho até que o motorista chegue até um local seguro ou seu destino. No Código de Trânsito é permitida a prorrogação do tempo de direção por 1 hora caso seja necessário dirigir até um lugar seguro.
O intervalo de 30 minutos a cada 4 horas de direção poderá ser fracionado em até três períodos de 10 minutos, conforme a Resolução 405/2012 do CONTRAN.
A fiscalização do cumprimento da jornada de trabalho será feita em locais próximos aos pontos de parada, para facilitar o cumprimento do descanso exigido, conforme especificado na Resolução 405/2012 do CONTRAN.
A construção de pontos de parada, um dos motivos citados para essa paralisação, que foi vetado na Lei, é de fato um complicador para sua implantação, porém o artigo 9º, que define as condições de sanitárias e de conforto nos pontos de parada está na Lei. As Entidades representativas dos motoristas empregados e autônomos, empresas de transportes podem ingressar com ação contra os órgãos responsáveis pelas vias para exigir o cumprimento da Lei, bem como locais de descanso, espera, embarque e destino, podendo também ser denunciado ao Ministério Público do Trabalho, Ministério do Trabalho e Emprego, Polícia Rodoviária Federal e Estadual e demais órgãos de fiscalização.
Planejamento
A Lei 12.619/2012 exige planejamento. Planejamento por parte das empresas, destinatários, embarcadores e dos trabalhadores autônomos.
Sabendo-se das horas que o motorista terá que dirigir até entregar a carga, das horas que ele terá que parar para descansar, é necessário que haja um planejamento rigoroso da viagem do motorista. As empresas não poderão simplesmente enviar os motoristas para entregar uma carga cientes que estes poderão ficar dias na fila para descarregar, caso isso ocorra, a empresa arcará com os custos – hospedagem, horas extras e de espera, adicional noturno, entre outros.
O mesmo ocorre com os autônomos, que terão de se planejar com os embarcadores e destinatários para que não haja perda de tempo.
O fato de ter uma jornada digna e horários de descanso determinados de forma alguma prejudica o motorista. Os empresários, embarcadores e tomadores de serviço irão se adaptar às novas regras, sem gerar prejuízos para os motoristas, tanto para os empregados como para os autônomos, priorizando, a partir de agora, o bem estar do motorista e não mais somente o lucro.
Conheça quem está contra a regulamentação
Nélio Botelho
Líder do Movimento União Brasil Caminhoneiro – MUBC, presidente da Cooperativa Brasileira dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens Ltda – Cobrascam e empresário.
Nélio Botelho possui um pátio com 160 mil metros quadrados, na saída da Rodovia Presidente Dutra, no Rio. A área, que equivale a 20 campos de futebol do tamanho do gramado do Maracanã, é usada para o pernoite de caminhoneiros. O terreno foi cedido em março de 1991 supostamente como parte de um convênio com a cooperativa. Pelo acordo, a Cobrascam se comprometia a pagar pelo arrendamento do terreno R$ 46 mil por semestre e prestar serviços aos caminhoneiros.
Uma investigação do DNER apurou que o terreno teria sido cedido sem licitação para a Cobrascam, por um diretor do DNER do Rio de Janeiro, no local são mantidos também um posto de gasolina, um restaurante e uma borracharia - atividades particulares de Nélio Botelho.
Em 2001, ano no qual essas informações foram apuradas, os aluguéis atrasados do pátio somavam R$ 689.088,55. Nélio mantém esse pátio até hoje, com todas as atividades descritas.
O local desse pátio é estratégico e as ações de Nélio começam sempre por ali. A Via Dutra é uma das mais movimentadas do país e durante as manifestações organizadas por Nélio é o primeiro lugar a ser bloqueado.
A União Brasil Caminhoneiros está instalada na sede da Cobrascam.
Para Nélio é muito conveniente que a Lei não seja cumprida, além de beneficiar as empresas com a exploração dos trabalhadores – sem o controle da jornada de trabalho, a construção de novos pontos de parada traria maior concorrência para seu pátio – e consequentemente, menos lucro.
Informações do Site do Ministério do Transporte
Deputado Jerônimo Goergen (PP-RS)
O deputado Jerônimo Goergen (PP-RS) apresentou uma proposta que reduz de 11 para 8 horas o tempo de descanso diário, podendo ser fracionado em seis horas mais duas. Já o tempo de descanso semanal cai de 35 para 32 horas pela nova redação. Em situações excepcionais, onde a estrada não dispõe de áreas de parada, o motorista poderia estender a jornada por até quatro horas de modo a permitir a chegada num local seguro.
A proposta apresentada pelo deputado só diminui o tempo de descanso dos motoristas, não melhora de forma alguma a situação dos motoristas. Se a alegação é que não existem pontos de parada, qual será a diferença entre um intervalo de 8 ou 11 horas? A diferença é que com 11 horas de descanso o motorista estará totalmente recuperado para enfrentar a jornada de trabalho seguinte, sem sono e sem precisar do auxílio de drogas para driblar o cansaço. Como resultado disso, muitas vidas serão preservadas nas estradas.
O deputado Jerônimo Goergen também esqueceu que a carga horária de trabalho está estabelecida na Constituição e não pode ser alterada com projetos de lei. Antes da regulamentação, a categoria dos motoristas não tinha esse direito respeitado.
Além dessa proposta, o deputado apresentou também uma emenda à medida provisória N ° 576/2012 de 16 de agosto de 2012 pedindo o adiamento da aplicabilidade da Lei 12.619/2012 por um ano, contado da data da sua publicação.
Deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP)
As afirmações daqueles que estão se declaram contra o controle da jornada de trabalho deixam clara a falta de proximidade com o tema discutido. O Deputado ruralista Nelson Marquezelli (PTB-SP), um dos parlamentares que não participou de nenhuma audiência pública durante a construção do Projeto de Lei que resultou na regulamentação e agora é contra as normas impostas pela Lei, afirmou que o descanso dos motoristas “à noite pode ser de seis horas, aonde ele quiser, aonde ele achar melhor, aonde ele tiver um amigo ou uma pousada, aonde ele tiver um lugar em que possa descansar".
É muito cômodo que o motorista descanse em qualquer lugar, assim não trará mais custos à empresa, ou no caso dos autônomos não aumentará o preço do frete. Para que está temendo pelo seu lucro, não importa onde o trabalhador irá descansar.
O deputado Nelson Marquezelli já esteve envolvido em algumas declarações polêmicas, como por exemplo, quando contra a PEC do Trabalho Escravo por não concordar que a terra na qual seja flagrada a utilização de mão de obra escrava, será destinada à Reforma Agrária. Neste mesmo discurso, o deputado afirmou que tirar a propriedade dos herdeiros é pior do que tirar a vida de alguém.
Neori Leobet - Tigrão
Conhecido como Tigrão, é um dos lideres do MUBC e está a frente das manifestações junto com Nélio Botelho.
Possui quatro empresas em seu nome, três na cidade de Ponta Grossa e uma em Carambeí, no Paraná. São três comércios de combustíveis e uma empresa de regulamentação de documentos (despachante).
Janir Bottega
Empresário, atua no ramo do transporte rodoviário de carga e comércio de peças para veículos na cidade de Pranchita no Paraná.
Janir que atende por presidente do Sinditac (Sindicato dos Transportadores Autônomos de Carga de Francisco Beltrão), sindicato esse que não possui registro ativo no Ministério do Trabalho.
Carlos Alberto Litti Dahmer
Presidente do Sinditac – Ijuí – RS (Sindicato dos Transportadores Autônomos de Carga de Ijuí) e possui caminhão e motorista registrado.
Fonte: Fetropar